A Escola do Futuro e o Futuro da Escola
Publicado por Marcos Toscano em 20.09.2007
Eu nunca neguei as tendências megalomaníacas de meu pensamento político, em especial no que diz respeito à uma preferência pela discussão antecipada de grandes questões que, acredito, eclodirão num futuro próximo. Gosto de discutir os impactos políticos das novas tecnologias, a nova dinâmica da propriedade que exsurgirá da plena interligação virtual do mundo, as novas formas de ocupação do tempo e da energia humanas em uma era que não mais necessitará do trabalho de massa…
Uma das sortes que tenho na vida são os companheiros que me puxam de volta à realidade e me cobram respostas para as questões de hoje. Em especial Rafael Dubeux, que sempre lembra que não podemos avançar na “agenda do futuro” sem saldar, ao menos em parte, os compromissos da “agenda do passado”. Como pensar nos impactos da manipulação genética em uma país coalhado de miseráveis favelizados e analfabetos?
Se é bem claro que as duas agendas não se excluem, há de se convir que é preciso decidir em qual se deve investir mais tempo e pensamento. Eu, entanto, ando pensando nas interligações desses dois universos de tempo e política. Deixem-me dar um claro exemplo, que desenvolverei brevemente nesse texto. No caso da urgente necessidade de melhoria do nível educacional do povo brasileiro, que faz parte da agenda do passado na tipologia dubesiana, a solução só pode ser dada pela agenda do futuro. Vamos esclarecer o assunto.
A educação pública no Brasil é claramente deficiente. A despeito dos inúmeros problemas com as instalações físicas das escolas, deve-se reconhecer que o problema maior é ligada aos recursos humanos. A pífia remuneração dos professores da escola pública, que fica a cargo de estados e municípios sem recursos, provoca a falta e a baixa qualificação dos educadores. Em resumo, as crianças e os adolescentes matriculados nas instituições públicas de ensino não têm aulas na quantidade e com a qualidade necessárias.
Resolver essa situação não é fácil. Estados e municípios simplesmente não tem condições financeiras para elevar a patamares dignos a remuneração dos professores, para contratá-los em número significativamente maior e nem mesmo para investir pesadamente na capacitação permanente do atual quadro de educadores. A escola tradicional, em que cada professor assume uma turma com uma quantidade moderada de alunos e os acompanha em todos os desenvolvimentos de sua disciplina está fadado ao fracasso, pois o número de alunos é estrondoso. Temos a impressão de que esse modelo funcionou bem no Brasil em tempos passados, mas é uma falsa idéia. Todos os que costumam dizer que escola pública era boa no tempo de seus pais esquecem que, à época, a escola era pra poucos. A paulatina democratização do acesso à educação levou milhões de crianças e adolescentes, antes excluídos do sistema público de ensino, às salas de aula em todo o país.
E então, como desatar esse nó? Senhores, a minha aposta para o futuro da escola é a escola do futuro. Desculpem-me o trocadilho, mas ele traduz bem meu pensamento. O único caminho viável para a melhoria da qualidade do ensino público no Brasil é o abandono do modelo tradicional de educação e a adoção de novas ferramentas tecnológicas. A Universidade Aberta do Brasil (UAB), criada pelo MEC de Fernando Haddad, é um bom começo, pois permite a capacitação simultânea e barata de milhares de professores. Mas é, como disse, só um começo. A tecnologia tem de se incorporar fortemente à escola pública.
A informatização das escolas não deve se restringir à instalação de um pequeno laboratório de micros, mas deve perpassar todas as etapas do processo educativo. Aulas por video-conferência, uso do computador em sala de aula, exibição de filmes-didáticos, tevê-escola etc., são algumas das formas de estruturar um novo modelo. Esses recursos irão nos ajudar a criar uma educação massiva que não seja de baixa qualidade, a reduzir a demanda por professores, a capacitá-los melhor e a remunerá-los melhor, uma vez que o impacto financeiro de salários mais elevados tenderá a ser menor.
A escola do futuro não é só uma questão de inovação tecnológica. Defendo a criação de centros de ensino federais (para o nível médio) geridos pelas Universidades Federais, que serviriam como complementação do sistema de ensino regular. Esses centros seriam frequentados pelos alunos do sistema educacional público que demonstrassem desempenho exemplar nos estudos, nos esportes, nas artes ou mesmo em trabalhos técnicos. Os docentes e discentes das universidades federais se envolveriam diretamente nos centros, que também teriam recursos tecnológicos de ponta. Os alunos que frequentassem os centros seriam monitores em suas respectivas escolas públicas, fazendo com que o investimento neles feito desse retorno para todos os seus colegas.
Tudo que aqui coloquei, claro, é apenas um esboço. Mas um bom esboço, penso, que aponta um caminho para resolvermos o problema da educação pública no Brasil. Se é certo que o futuro trará novas e graves questões a serem resolvidas, também é verdade que ele vai lançando luz sobre muitos pontos da “agenda do passado”. É preciso saber brincar com o tempo.
P.s.: O governo federal vai, mais uma vez, dar aumentos substanciais para a polícia federal, para os advogados da união, para os auditores da receita e para o ciclo de gestão. Os docentes do ensino superior e os pesquisadores de ciência e tecnologia não levarão nada muito substancial, continuando com uma remuneração bem abaixo das citadas categorias. A cegueira dos governantes vai acabando com as nossas parcas chances de mudar esse país…
Marcos Toscano: Marcos Toscano é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental e faz Mestrado em Filosofia na Universidade de Brasília.
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